Dalai Lama anuncia que irá reencarnar e inicia processo de sucessão espiritual
Aos 90 anos, líder do budismo tibetano confirma que tradição continuará e reforça que seu sucessor nascerá fora da China

Prestes a completar 90 anos neste domingo (6), o atual Dalai Lama, Tenzin Gyatso, afirmou que irá reencarnar após sua morte, dando início ao processo milenar de busca pelo próximo líder espiritual do budismo tibetano. A declaração, feita nesta quarta-feira (2), reacende a atenção global para um ritual que envolve profecias, sinais místicos e antigos costumes preservados há séculos.
O anúncio também tem forte peso político. O Dalai Lama deixou claro que sua reencarnação ocorrerá fora da China e pediu que seus seguidores rejeitem qualquer sucessor indicado pelo governo chinês, que há anos tenta controlar a sucessão para ampliar seu domínio sobre o Tibete.
Como é feita a busca pela reencarnação
A tradição budista tibetana considera que o Dalai Lama é a manifestação de Avalokiteshvara, o Buda da Compaixão. Segundo a crença, após sua morte, o espírito do líder reencarna em uma nova criança, que será identificada por monges treinados. Esse processo pode levar anos e envolve:
- Visões e profecias de monges
- Interpretação da fumaça da pira funerária
- Busca por crianças com sinais físicos específicos, como orelhas grandes, marcas no corpo e até palmas com desenhos em forma de concha.
- Reconhecimento de objetos pessoais do Dalai Lama anterior: a criança precisa identificar corretamente pertences ou pessoas ligadas à sua vida anterior.
A busca é conduzida por grupos de monges, muitas vezes disfarçados, que viajam por diferentes regiões guiados por pistas deixadas pelo Dalai Lama anterior.
A infância do atual Dalai Lama
Tenzin Gyatso foi reconhecido como o 14º Dalai Lama quando tinha apenas dois anos, em 1937. Nascido como Lhamo Dhondup, em uma vila remota na região de Amdo, hoje pertencente à China, ele foi encontrado após visões de monges e a identificação de características consideradas sagradas.
Segundo sua biografia, a equipe de busca percebeu o acerto quando o menino reconheceu objetos do antigo Dalai Lama como sendo seus. Após o reconhecimento, ele foi levado a um mosteiro para estudar teologia e se preparar para liderar espiritualmente o Tibete.
Em 1950, aos 15 anos, foi proclamado chefe de Estado tibetano, em meio à crescente ocupação chinesa. Nove anos depois, exilou-se na Índia, onde vive até hoje e atua como símbolo da resistência pacífica tibetana. Em 1989, recebeu o Prêmio Nobel da Paz por sua luta baseada na tolerância e no respeito mútuo.
O futuro da linhagem
O Dalai Lama afirmou que ainda não deixou instruções por escrito sobre sua sucessão, mas que essa carta será publicada no momento certo, contendo pistas sobre o local e as características da criança que será identificada como sua reencarnação, o 15º Dalai Lama.
O líder também já disse, em ocasiões anteriores, que a próxima encarnação poderia ser uma mulher — uma ideia inovadora dentro da tradição budista tibetana.
Thupten Jinpa, ex-monge e tradutor oficial do Dalai Lama desde 1985, explicou que Sua Santidade nem sempre considera que todos os 14 Dalai Lamas anteriores foram necessariamente a mesma alma, mas que todos compartilham uma ligação especial com a linhagem espiritual que representam.
Espiritualidade e política
Além de sua importância religiosa, a sucessão do Dalai Lama é motivo de tensão internacional. O governo chinês já declarou que pretende reconhecer sua própria versão de um novo líder espiritual, o que é visto como uma ameaça à independência do budismo tibetano e à identidade cultural do povo do Tibete.
Diante disso, a declaração de Tenzin Gyatso ganha ainda mais peso. Ao confirmar que a tradição continuará e que seu sucessor não nascerá sob influência chinesa, o atual Dalai Lama reforça a resistência pacífica de seu povo — e a esperança de que sua linhagem continue viva por muitas gerações.
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